Onde tudo começa? Navegando entre livros e conhecendo o mundo a partir da Educação Infantil

Por Doca Latalisa e Adriana Monteiro | Publicado em 15 de junho de 2021

Se pararmos para pensar um pouco sobre nossa relação com a literatura na escola, muitos de nós provavelmente lembraríamos da realização de provas de verificação de leitura, do preenchimento de fichas de livros, de pesquisas sobre o Barroco, o Arcadismo, o Romantismo… Talvez não venha nenhuma lembrança sobre algo que tenha nos envolvido, afetado e emocionado efetivamente. 

O contato com os livros no contexto escolar tem sido marcado por propostas que, muitas vezes, descaracterizam o seu potencial artístico e sua capacidade de falar sobre a experiência humana, sensações e emoções, sobre outras culturas, outros tempos e até mesmo sobre outros planetas. Realidades que não necessariamente existem, mas que, na literatura, ganham vida.

Atividades muito comumente propostas aos estudantes – como a produção de relatos sem graça sobre as férias, resumos protocolares de livros e escrita de contos de fada que, muitas vezes, prendem-se ao estereótipo de trazer ao final do texto uma lição de moral já conhecida – apenas reforçam o divórcio entre a literatura e a imaginação, a criatividade e o vislumbre de outros mundos possíveis. Mas a presença da literatura na escola não pode ser reduzida a essa perspectiva, especialmente na Educação Infantil. É imprescindível que as crianças pequenas tenham vivências com os livros e com as histórias que as possibilitem navegar por mares absolutamente desconhecidos, abrindo espaço para a curiosidade e para o desejo de descoberta.

As crianças precisam se aventurar em viagens como a do personagem Max, no clássico infantil Onde Vivem os Monstros, de Maurice Sendak, em que um garoto de 5 anos, após meses e meses vivendo uma aventura indômita, volta ao aconchego de seu quarto e encontra seu jantar ainda quentinho, esperando-o.

A literatura deve ser entendida como um direito de todos e todas, incluindo aqueles que acabaram de chegar ao mundo. Não apenas porque com ela as crianças ampliam seu vocabulário, aprendem sobre o funcionamento das coisas à sua volta e iniciam o processo de construção de suas bagagens culturais, mas também porque os livros colaboram para o desenvolvimento infantil como um todo. 

A partir dos dilemas, tensões, soluções e conflitos narrados pelas histórias, as crianças são apresentadas a acontecimentos que as encantam, assustam, fascinam e surpreendem. A literatura possibilita a conexão com sentimentos que, muitas vezes, não compreendemos pelas vias da razão.


“Coragem: É quando você está forte, seguro de si e venceu o medo. É quando você acredita que vai conseguir!” - Trecho retirado do trabalho dos alunos do Fundamental I: O Emocionário

O envolvimento com as personagens e suas aventuras permite às crianças sentir medo, entusiasmo, felicidade, tristeza e decepção. E é exatamente este “sonhar acordado” que possibilita, a partir das palavras, pensar e aprender sobre a humanidade.

Por isso, a literatura infantil é, antes de mais nada, um encontro das crianças consigo mesmas. Encontro com experiências cotidianas e com modos de ser totalmente desconhecidos que, com os livros, passam a ser identificados. Em outras palavras, é um encontro ao mesmo tempo com o diverso e com o semelhante. 

É também um encontro com o ritmo particular dos livros: a possibilidade de suspender o tempo, as horas, a correria, a rotina e o imediato, permitindo a conexão com o outro. Olhar para o outro e reconhecê-lo como parte de nós. Estabelecer diálogos e mudar de ponto de vista.

Isso não significa, contudo, que a literatura é um mar plácido e sereno, no qual tudo é somente alegria e realização. Muitas vezes, o encontro conosco e com os outros ocorre por meio do conflito. Mas é também a partir do conflito que nosso crescimento acontece, pois ele possibilita nos relacionarmos com sentimentos que se farão presentes mais cedo ou mais tarde.

Por isso, garantir o contato com a literatura na Educação Infantil é fundamental para o aprendizado das crianças. Assim como as brincadeiras, os livros colaboram para o desenvolvimento social, pessoal e emocional de cada criança. Mas é importante notar que isso pressupõe respeitar tanto os questionamentos quanto os silêncios das crianças. 

A leitura guiada de textos literários precisa ser cuidadosamente planejada, assegurando o acolhimento a diferentes opiniões, pensamentos, afetos e desafetos. Não há um único modo de compreender uma história, nem de senti-la. O que importa é a experiência de cada criança diante de um livro e, para isso, não há certo ou errado.

Pensando na importância do lúdico na Educação Infantil, nós, do Grupo Balão Vermelho, convidamos você para refletir sobre o papel da literatura no desenvolvimento infantil ao lado de um grande especialista da área, Felipe Munita (pesquisador sobre a leitura mediada e professor da Pontificia Universidad Católica de Chile). 

Como fazer com que as crianças se interessem pelos livros? Qual é o papel da escola no contato dos pequenos com o universo literário?O encontro acontecerá na terça-feira, dia 22/06, das 19h às 20h30, e faz parte do evento “Onde tudo começa? – A escola e a família no centro do desenvolvimento infantil”, organizado pela Bahema Educação e pelo Centro de Formação da Vila.

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